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Doador de Órgãos não estava morto

Antes de prosseguir à matéria, gostaria de fazer uma ressalva pessoal: Sou completamente a favor da doação de órgãos desde que cumpridos todos os trâmites legais. De nada adianta salvar vidas em sacrifício de outra em potencial. Portanto, desde que a morte encefálica esteja confirmada e atestada, sou inteiramente a favor da doação de órgãos, tecidos e tudo o mais que seja possível à ciencia da época. O intuito de postar esta matéria aqui é o de alertar os médicos e futuros médicos a prestarem atenção em suas decisões e lembrar que aquele paciente (e não "cliente") é um ente querido de alguém, que poderia ser você. O ocorrido relatado aconteceu na França. Segue a matéria, retirada integralmente do site Terra Ciência:

Doador de Órgãos não estava morto

Os cirurgiões que cercavam o paciente inerte quase desmaiaram: o homem cujo coração estava parado há uma hora e meia e cujos órgãos eles estavam se preparando para recolher a fim de utilizar em transplantes terminou despertando na mesa de cirurgia.

Trata-se de um caso na fronteira entre vida e morte, e de um tema que suscita reflexão e emoção entre os profissionais da medicina - especialmente os especialistas em reanimação e as autoridades que regulamentam a bioética -, e os obriga a questionar que critérios objetivos permitem definir a partir de que momento um paciente que foi submetido a tentativas de reanimação pode começar a ser considerado um doador de órgãos, sabendo-se que esses órgãos, quando colhidos, permitem prolongar a esperança de vida de outros doentes.

No começo deste ano, em Paris, um homem de 45 anos caiu na rua, e apresentava todos os sintomas de um infarto maciço do miocárdio. Mais tarde, os médicos descobriram que, embora soubesse estar enfrentando uma situação de alto risco cardíaco, o homem não seguia seu tratamento.

A intervenção quase imediata do serviço de assistência médica confirmou o diagnóstico inicial, e os paramédicos iniciaram imediatamente os procedimentos de reanimação, menos de 10 minutos depois do incidente cardíaco sofrido pelo paciente. No entanto, os esforços deles não resultaram em retomada espontânea do batimento cardíaco.

O fato de que estavam próximos ao complexo hospitalar de La Pitié-Salpêtrière, onde seria possível praticar uma dilatação das artérias coronárias da vítima, fez com que os paramédicos decidissem continuar tentando as manobras padronizadas de reanimação do paciente, enquanto o transportavam em alta velocidade rumo ao hospital especializado.

Quando chegaram, o coração do paciente ainda não havia recomeçado a bater e, depois de uma análise rápida da ficha, uma equipe de cardiologistas do hospital concluiu que uma dilatação coronária não poderia ser realizada, por motivos técnicos. Os médicos começaram imediatamente a considerar o paciente como potencial doador de órgãos: um doador classificado como "inativo em termos cardíacos".

O que aconteceu em seguida nesse estranho caso foi relatado em um documento oficial preparado durante uma reunião de um grupo de trabalho que trata das questões morais envolvidas nesse tipo de situação, e que recentemente veio a formar um núcleo sob os auspícios do "espaço ético" da Assistência Pública-Hospitais de Paris (AP-HP), a organização municipal de saúde da capital francesa.

Na reunião, foi descoberto que os cirurgiões que poderiam proceder à coleta de órgãos para possíveis transplantes não estavam imediatamente disponíveis. Quando eles por fim chegaram ao bloco em que o paciente estava internado, encontraram seus colegas ainda envolvidos em massagem cardíaca do paciente, depois de uma hora e meia de paralisação do coração ¿ e ainda sem resultado aparente.

Mas, no exato momento em que estavam se preparando para iniciar a coleta de órgãos, os médicos descobriram, com imensa surpresa, que o paciente estava apresentando sinais de respiração espontânea, que suas pupilas pareciam se ter reanimado e que ele exibia traços de reação a procedimentos de estímulo doloroso.

Ou seja, para dizer de outra maneira, havia "sinais de vida", um enunciado equivalente a determinar a ausência de sinais clínicos de morte, como afirma o relatório, que prossegue alegando que "depois de diversas semanas de tratamento e de enfrentar uma séria de outras complicações graves, o paciente agora está andando e falando, e os detalhes concernentes ao seu estado neurológico não são conhecidos". O texto infelizmente não informa se o paciente está ou não ciente de que seus órgãos quase foram colhidos para transplantes.

Mais comum do que se pensa

No curso da mesma reunião, diversos outros especialistas em reanimação, a começar por aqueles que trabalham no departamento de emergência de Paris, evocaram situações nas quais "uma pessoa estava convencida da sobrevivência de um paciente, depois de manobras de reanimação prolongadas, com duração bem superior à habitual, e consideradas como razoáveis em casos dúbios como esses".

Todos os presentes reconheceram que esses casos envolvem histórias bastante excepcionais, mas admitiram tê-las encontrado ao longo de suas carreiras. "Os participantes enfatizaram que, caso as recomendações oficiais que estão em vigor no momento tivessem sido seguidas à risca, o paciente provavelmente teria sido considerado como morto".

A situação representa uma ilustração poderosa de questões que persistem, irresolvidas, no ramo da reanimação médica, quanto a modalidades de intervenção e critérios que permitam determinar o fracasso de um esforço de reanimação, consideraram os especialistas.

Um caso como o do paciente parisiense não poderia ter acontecido na França antes de 2007, quando a prática de coleta de órgãos de pacientes com o coração inativo era proibida. Até o ano passado, a coleta de órgãos para transplantes só podia ser realizada no país em casos de coma nos quais a morte cerebral do paciente fosse constatada e confirmada por eletrocardiogramas e por exames neuro-radiológicos.

Para atender à escassez crônica de órgãos para transplante disponíveis, as autoridades que comandam a Agência de Biomedicina francesa decidiram lançar no começo de 2007 um programa experimental, nos hospitais, sob o qual pessoas cujo coração tenha deixado de bater seriam submetidas a esforços de reanimação por massagem cardíaca, respiração mecânica e, em certos casos, circulação extracorpórea.

Le Monde

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